O concurso público é
o meio mais ético, impessoal, isonômico e eficaz para a Administração
Pública, a qual, valendo-se de processos seletivos, permite a
investidura a emprego ou cargo público de modo amplo e democrático e
propicia a seleção dos candidatos mais preparados. O concurso público é a
via régia para acesso aos cargos públicos, contudo a Constituição Federal
prevêque contratações públicas podem ocorrer sem a sua realização em
duas exceções, quais sejam: a) nomeação para cargos comissionados e
restrita a atividades de direção, chefia e assessoramento (artigo 37,
inciso V); e b) contratação temporária, só permitida em situações
excepcionais e transitórias (artigo 37, IX).
O alto nível de
exigência das provas dos concursos favorece, na melhoria do padrão de
especialização do quadro de servidores e, consequentemente, na eficácia
da máquina pública – é a consagração de um dos princípios que rege a
atividade administrativa, o principio da eficiência.
Certames cada vez
mais organizados e especializados usam técnicas aperfeiçoadas para
avaliar com segurança os candidatos mais "gabaritados" para cada tipo de
cargo e ocupação na esfera pública.
O cérebro dos concursos
As chamadas
comissões ou bancas examinadoras surgiram porque, em geral, a
administração pública não tem estrutura e pessoal especializado para
selecionar os candidatos que deverão preencher as vagas disponíveis.
Assim, atualmente, os concursos para os mais variados cargos são
realizados por bancas de altíssimo renome, que contam com destacados
doutores e técnicos em seus quadros. Entretanto, nem todos os concursos
são feitos por bancas examinadoras de renome, pois inúmeras empresas
desse tipo foram surgindo nas vastas extensões brasileiras, em geral,
cobrindo mercados locais.
A contratação da
banca examinadora pela Administração é regida pela lei de licitações,
seja através de processo licitatório, cujo tipo deve prever o fator
"técnica", seja via contratação direta nas restritas hipóteses previstas
nos artigos 24, XIII e 25, II da lei 8.666/93.
A banca examinadora
é o cérebro dos concursos públicos, e existem até estudos sobre o
comportamento das mais festejadas, analisando-se detalhadamente o estilo
de suas provas e exames.
É muito comum a
Administração delegar à banca examinadora diversas fases do certame,
tais como: a elaboração, aplicação e correção das provas, o exame de
títulos, a aplicação de provas físicas, e de exames de saúde,
investigação social, etc. Por outro lado, nos certames em que há curso
de formação, é comum a própria Administração promovê-lo.
Quando as bancas cometem os erros e quais são os principais
Como qualquer
atividade humana, aquela afeta às bancas examinadoras também está
sujeita a erros. Tal realidade pode ser atestada pela crescente
quantidade de recursos administrativos e ações judiciais movidas por
candidatos supostamente prejudicados. Multiplicam-se casos já julgados,
como o de dois candidatos de um concurso para auditor-fiscal realizado
em Brasília. Eles conseguiram provar que uma questão da prova deveria
ser anulada porque tinha dupla resposta. O erro foi reconhecido em
julgamento, o qual lhes deu ganho de causa e determinou que fossem
nomeados nos cargos, com o direito ao recebimento dos vencimentos
atrasados como indenização.
A maioria dos
concursos se limita a provas objetivas e discursivas, que podem ser
seguidas de exames práticos, como o de digitação. Mas há concursos com
outras fases, como apresentação de títulos, provas de capacidade física,
testes de saúde e psicotécnicos, investigação social e prova oral.
Nossa intenção com
este artigo é municiar o "concurseiro" com mais informações que ampliem
seu conhecimento sobre as bancas examinadoras. Desse modo, vamos
analisar, a seguir, os erros ou equívocos mais frequentes de cada etapa
dos concursos públicos.
Prova objetiva
Os erros mais frequentes nas provas objetivas
(aquelas próprias à marcação de um “x”, chamadas de múltipla escolha)
são: I - questões com mais de uma resposta ou, ainda, não tendo resposta
correta; II - questões com vício material; e, III - questões com temas
que não constam no conteúdo programático consignado no edital.
Questões com
respostas duplas e com temas não contemplados no edital ensejam sua
anulação e recontagem dos pontos. Como exemplo de tais equívocos, dentre
inúmeros julgados, citamos o voto da Exma. Ministra Eliana Calmon, do
STJ, que, no RMS n. 24.080/MG, traz o seguinte entendimento:
"O mero
confronto entre as questões da prova e o edital pode ser suficiente para
verificar a ocorrência de um defeito grave, considerando como tal não
apenas a formulação de questões sobre matéria não contida no edital, mas também a elaboração de questões de múltipla escolha que apresentam mais de uma alternativa correta, ou nenhuma alternativa correta, nas hipóteses em que o edital determina a escolha de uma única proposição correta.
Por conseguinte,
em situações excepcionais, em que os vícios constantes de questões
objetivas não puderem ser sanados, ou seja, sejam tão graves, a ponto de
representarem flagrante erro material, ou ainda, tratarem de matéria
não prevista em edital, em óbvio desrespeito à chamada ‘lei que rege os
certames públicos’, será admitida a intromissão do Poder Judiciário,
para anular a questão objetiva eivada de erro invencível ou grosseiro,
tão pernicioso à idoneidade e à legitimidade do Concurso Público.” (grifos nosso) RMS 24.080/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/06/2007, DJ 29/06/2007, p. 526
Também são anulados
e recontados os pontos das questões que não apresentam alternativa
correspondente a uma resposta verdadeira. Um exemplo hipotético de
pergunta sem resposta seria: "Qual destas cidades fica em São Paulo: a)
Vitória, b) Manaus, c) Maceió, d) Porto Alegre." Julgado do STJ REsp
471.360/DF, Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma,
julgado em 21/09/2006.
Já as questões com
vício material são as que apresentam erros como o do exemplo a seguir,
em que a revisão falhou ao ordenar as letras das assertivas, deixando a
coluna das respostas na seguinte "ordem" alfabética: a, b, c, e, d. Na
ocasião, o equívoco causou grave problema porque a alternativa certa era
a letra "e", a qual, em tese, seria a última da coluna. Esse erro
aconteceu em um concurso federal e a questão foi anulada judicialmente
nos autos do processo 0001710-26.2010.4.01.3400 da Justiça Federal do
DF.
Prova discursiva
Nas provas discursivas os
principais erros são: I - apresentar questões sobre temas que estão
fora do programa do edital; II - não ter critérios claros para a
correção da prova; III - não respeitar o princípio da isonomia nas avaliações; e, IV - não explicar o motivo dos descontos na nota.
Realizado em 2008, o
julgamento de ação movida por um candidato que denunciou a solicitação
em prova de conteúdo não constante no edital gerou este comentário de um
membro da nossa alta Corte de Justiça, o eminente desembargador Eros
Grau: "Não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca
examinadora, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se
continham no programa do certame, dado que o edital – nele incluído o
programa – é a lei do concurso".
A avaliação das
provas deve obrigatoriamente ser objetiva e fundamentada. A falta de
critérios claros de avaliação constitui erro que prejudica os
candidatos. Um exemplo de transparência está na realização de pergunta
que evidencie o peso de cada aspecto a ser considerado na sua resposta.
Exemplo: “Discorra sobre a penalidade de declaração de inidoneidade
(2,5 pontos) informando quem aplica (2,5 pontos), seus efeitos (2,5
pontos) e o recurso cabível contra ela (2,5 pontos)”.
O erro de isonomia é
muito comum e ocorre, por exemplo, quando notas diferentes são
atribuídas a candidatos que tiveram o mesmo desempenho. Também configura
erro o fato de a banca examinadora limitar-se a dar a nota final
da prova, sem justificar os descontos. Afinal, a correção das provas
dos concursos públicos é um ato administrativo e, como tal, rege-se pelo
inciso III do art. 50 da lei Federal 9.784/99.
Esse dispositivo determina que os atos que decidem processos
administrativos de concurso ou seleção pública devem ser devidamente
motivados. Sem saber os motivos dos descontos, o candidato fica
prejudicado em seu direito à ampla defesa e ao contraditório.
Fase de títulos
Os erros mais
comuns cometidos pelas bancas na fase de títulos de um concurso: I -
eliminar o candidato com base na avaliação de seus títulos; II -
distribuir desproporcionalmente os pontos atribuídos aos títulos; III -
exigir títulos para cargos de nível médio; e, IV - não aceitar títulos
sob alegação de erros formais.
Como é sabido, além
de ter ficado claro, no entendimento dos tribunais, que a fase de
títulos não pode ser exigida para candidatos de nível médio e é
meramente classificatória. Os outros erros que ocorrem nessa etapa são
comuns aos que acontecem nas fases já abordadas, decorrendo,
basicamente, da falta de critérios claros para fundamentar a avaliação.
Exame psicotécnico
A julgar pela
grande quantidade de reclamações de candidatos e de ações acatadas pela
Justiça, esse parece ser o ponto fraco das bancas examinadoras, ou seja,
a área em que mais erros são cometidos. Identificamos seis erros
principais, os quais dispensam detalhada explicação, uma vez que se
mostram como evidentes fatores de prejuízo e desrespeito aos direitos
dos candidatos.
O primeiro é exigir esse tipo de exame sem que isso esteja previsto em lei.
Insta transcrever o enunciado da Súmula 686 do STF:
"STF Súmula nº 686 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5. Exame Psicotécnico - Candidato a Cargo Público. Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público."
O outro é a falta
de critérios objetivos na avaliação do candidato, o que fere o princípio
da isonomia. O terceiro erro, igualmente comum, é usar o exame
psicotécnico para aferir perfil profissiográfico (análise do histórico
laboral) do candidato. A propósito, a meta do exame psicotécnico, que é
de avaliação psicológica, fica desvirtuada, pois as capacidades
profissionais do candidato passam a ser indevidamente levadas em conta. O
quarto maior motivo de reclamação contra tal etapa liga-se ao fato de o
laudo de eliminação não fundamentar as razões que levaram a esse
veredito. O quinto problema é a banca se negar a uma entrevista
devolutiva com o candidato. Por fim, o sexto equívoco decorre de vários
problemas anteriores, principalmente da falta de acesso a informações e
critérios, o que deixa o candidato sem meios de mover recursos.
Investigação social
O erro mais comum é
exigir sua realização sem que haja previsão legal para isso, o que pode
gerar a eliminação de candidatos por motivos desarrazoados e sem
explicação.
Prova física
Nesta fase, três
erros das bancas examinadoras se destacam: I - a falta de previsão
legal; II - a exigência desse exame para cargos burocráticos; e, III - a
falta de proporcionalidade ou a quebra na isonomia no processo,
significando que os exames e suas condições de realização devem ser
iguais para todos os candidatos. Um exemplo é um grupo de candidatos
fazer prova de resistência física pela manhã, enquanto outro ser instado
a fazê-la ao meio-dia, sob o sol forte.
Prova oral
Esta fase é
restrita a poucos concursos, tais como: magistraturas, ministérios
públicos estaduais e federais e outras poucas carreiras.
Os principais erros
que podem ocorrer nesta fase são: I – ausência de padrão de resposta
esperada do candidato e quanto vale cada ponto explorado, bem assim das
perguntas que são sorteadas previamente à realização das provas
(diferente dos temas, que se embasarão as perguntas, cujo sorteio
normalmente ocorre com 24 à 48 horas de antecedência da prova). Tanto as
perguntas quanto as respostas esperadas devem ficar em envelopes
lacrados e guardados em condições de confidencialidade até o momento de
sua abertura que ocorrerá na hora da prova e ficará com o examinador,
devendo, depois, ser franqueado ao candidato; II – ausência de filmagem
da prova inviabilizando o direito de defesa do candidato; e, III – o
alto grau de subjetividade dos membros da comissão examinadora ao
avaliar os candidatos, especialmente quando presentes os erros acima
apresentados;
Conhecer para exercer
Diante do exposto,
entendemos que essa lista dos mais recorrentes erros cometidos pelas
bancas examinadoras dos concursos públicos deve ser conhecida por
qualquer "concurseiro" atento, sobretudo porque pode lhe dar subsídios
para uma eventual defesa.
Reputamos, como essencial, também, a leitura do capítulo "COMO E QUANDO RECORRER" do festejado livro Como Passar em Provas e Concursos – Resumo – 10ª Ed. 2012 - Editora Impetus, do "guru dos concursos" William Douglas.
Ao leitor que quiser se aprofundar nesse assunto, recomendamos ainda, nosso livro que está no prelo: Concurso Público: os direitos fundamentais do candidato. A
obra, que será lançada pela editora GEN/Método, analisa dezenas de
situações, trazendo fundamentação legal e decisões judiciais, listando
as providências que podem ser tomadas para exercer cada direito.